terça-feira, 22 de maio de 2012

Por que não devemos impermeabilizar a cidade?

Os centros urbanos, em especial as grandes cidades, apresentam um traço comum que é muito pouco discutido: constituem áreas onde os terrenos são quase que totalmente impermeabilizados. Essa impermeabilização se dá através do asfaltamento das ruas, do calçamento das praças, da cimentação dos quintais e da construção de casas e edifícios. Até parece que o homem da cidade tem alergia a áreas não cimentadas. Em muitas capitais brasileiras, existem bairros nos quais o nível de impermeabilização é próximo de 100%.


A esta altura, você deve estar se perguntado: - Que mal existe na impermeabilização dos terrenos urbanos? A resposta é, a princípio, muito simples: “Para permitir a infiltração das águas das chuvas”. No caso específico da cidade de Natal-RN, esse problema se torna mais crítico pelo fato de a cidade estar plantada sobre seu principal reservatório de água potável, o sistema aqüífero Dunas-Barreiras. Ao se intensificar a impermeabilização do solo na área metropolitana de Natal, as condições de reposição da água dos lençóis subterrâneos estão sendo comprometidas. É como se estivesse fechando as portas de entrada das águas de chuva para o subsolo. E, em não havendo circulação de água, não teremos o reabastecimento do aqüífero. Considerando que o adensamento populacional leva ao incremento do consumo de água, não precisa ser um especialista para concluir que, em função desse desequilíbrio, em breve estaremos retirando mais água do que a natureza é capaz de repor. Resultado: esse reservatório de água vai começar a secar.

Para tornar mais clara a questão da impermeabilização do solo nas áreas urbanas, é preciso comentar os seguintes aspectos: (1) em qualquer área desabitada, o equilíbrio no ciclo das águas se dá de forma natural, através dos processos de evaporação, escoamento superficial e infiltração; (2) Ao se construir a primeira casa, para formar um povoado, inicia-se o processo de impermeabilização do terreno e provoca-se uma quebra no equilíbrio do sistema; (3) Esse é um ponto que precisa ser considerado quando da elaboração dos projetos de urbanização de uma cidade.

Na maioria das cidades brasileiras, o problema da impermeabilização do solo não tem sido levado muito a sério. Apesar de estar muitas vezes contemplado no plano diretor da cidade, o que se observa é o descumprimento da lei. É freqüente nos depararmos com projetos recentes de engenharia em que a impermeabilização do terreno é plena. Se você mora em edifício, experimente fazer uma estimativa do percentual de terreno que foi reservado para permitir a infiltração natural de água da chuva. Se esse percentual for inferior a 20% da área total do terreno, do ponto de vista legal, o seu edifício está infringindo uma lei municipal.

Quais as conseqüências danosas desse problema para a nossa cidade? Podemos fazer referência a duas delas: em primeiro lugar, essa impermeabilização excessiva compromete a recarga natural dos lençóis de água subterrânea, ponto já comentado anteriormente; em segundo lugar, quase todo o volume de água da chuva, que anteriormente conseguia se infiltrar no solo, passa a escoar pela superfície, contribuindo para agravar os problemas de alagamentos na cidade. Daí a importância e urgência de resolvermos o problema da impermeabilização do solo nas cidades como Natal, Fortaleza e Recife, que foram construídas em áreas com cobertura sedimentar, que guardam no seu interior importantes aquíferos.

Retirado do livro "Pedagogia da Água"
Autor: João de Deus Souto Filho

sábado, 12 de maio de 2012

Quanto custa um copo d'água?

Para nós que dispomos de recursos e que consumimos água mineral cotidianamente a resposta é aparentemente simples: - Um copo d'água custa, nos supermercados e nos bares, algo entre vinte e cinqüenta centavos. Um valor aparentemente baixo, para o consumidor desatento, se considerarmos a questão pontualmente. E aí somos levados a refletir sobre o valor real da água. De uma maneira geral, o brasileiro que habita os centros urbanos nunca se preocupou seriamente com a economia de água. Fomos criados com a idéia de que água é um recurso infinito e de baixo valor. Daí a cultura do desperdício.


Hoje, quando a questão da disponibilização de água potável nos grandes centros urbanos está cada vez mais crítica, nos vemos diante de uma situação difícil de ser imaginada poucos anos atrás, qual seja, de aumento do custo da água em função da sua escassez. Estamos preparados para enfrentar essa dura realidade? Se compararmos a nossa situação com países europeus, onde a água é um produto bastante escasso, a perspectiva é de termos as nossas contas de água aumentadas em até 500%. Com a aprovação da lei federal 9.433, em 1977, que visa regulamentar o setor, o país está se preparando para valorar os seus recursos hídricos, passando a cobrar pelo seu uso. Cabe ressaltar que atualmente nós só pagamos às distribuidoras de água pela coleta, tratamento e distribuição da água que sai nas nossas torneiras. Num futuro próximo, estaremos pagando também pela retirada da água dos mananciais superficiais e subterrâneos. Será que seguiremos desperdiçando água como fazemos atualmente?

Falar de valoração da água pode soar estranho para muitas pessoas, especialmente para aqueles que foram criados na abastança. Talvez devêssemos dar mais atenção para a luta dos nossos irmãos que vivem no sertão nordestino, eles sim têm a noção clara do valor da água. Para os flagelados da seca, água não é sinônimo de produto de baixo valor, para eles é uma questão de vida ou morte. Em situações limites, quanto vale um copo d'água?

Devemos reconhecer que no dia-a-dia conversamos muito pouco sobre este assunto. Quantas vezes já tivemos a oportunidade de discutir isso com os nossos filhos? Com que freqüência esse tema é debatido nas escolas? Qual o grau de envolvimento da mídia com respeito à necessidade de mudar os hábitos da população para fazer melhor uso desse bem tão precioso? Permita-nos abrir um parêntese com respeito a esse ponto: Em setembro de 2000, encaminhei para todas as empresas televisivas da cidade de Natal (TV Cabugi, TV Ponta Negra, TV Tropical e TV Potengi) a seguinte proposta: "Incluir na pauta dos Jornais Diários um espaço reservado para a ÁGUA, da mesma forma que existe um espaço para as informações meteorológicas". Esse espaço nos Jornais Diários poderia ser de 30 segundos, de forma a não comprometer a programação jornalística existente. Não recebi resposta de nenhuma delas. De fato, quando aprofundamos essa questão, concluímos que muita coisa ainda precisa ser feita para enfrentarmos o problema da escassez de água nos centros urbanos. Talvez, quando estivermos pagando algo em torno de dez dólares por cada mil litros de água disponibilizados para as nossas casas, como já ocorre em algumas cidades da Alemanha, passemos a ter uma idéia mais clara do valor da água.

Retirado do livro "Pedagogia da Água"
Autor: João de Deus Souto Filho

domingo, 6 de maio de 2012

Rios de águas tóxicas


            O Brasil está acordando para uma realidade alarmante. Os seus principais rios, do extremo norte amazônico às fronteiras do Rio Grande do Sul com o Uruguai, apresentam elevados níveis de contaminação por substâncias tóxicas. Esse processo de degradação dos corpos d’água já faz parte da cultura do brasileiro. Tanto para os administradores públicos como para os empresários da indústria e agropecuária, bem como para o cidadão comum, existe um bordão que já virou costume (um mau costume por sinal): o que não presta e é sujo joga no rio. Como, por exemplo, ocorre com os esgotos domésticos e industriais. 
             É bem verdade que a natureza tem uma capacidade depuradora considerável, mas também já é do conhecimento geral que essa capacidade depuradora tem limites. E os rios brasileiros, particularmente aqueles situados próximos dos núcleos urbanos, já alcançaram esse limite há muito tempo. Nós, humanos, poluímos os nossos rios numa velocidade que a natureza não consegue mais se autodepurar. Estudos realizados nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro constataram que há metais pesados e outros produtos tóxicos sobrando nos rios do sudeste do país, todos sujos por esgoto urbano, rejeitos industriais e agrotóxicos. Existe grande quantidade de cobre, mercúrio, zinco, chumbo, arsênio e fenóis nos rios brasileiros. Isso sem contar os coliformes fecais e o material sólido que são vistos diariamente “passeando” pelas águas de rios, riachos e lagoas.
                  Os reflexos dessas contaminações na saúde também são por demais conhecidos. Sabe-se, por exemplo, que altos índices de mercúrio podem matar em dez dias ou causar danos irreversíveis ao cérebro, lesões renais e distúrbios na fala, visão e tato. Por sua vez, o arsênio causa câncer de pele e fígado; o zinco pode causar problemas pulmonares; e o cádmio, danos à medula óssea. Sem falar, é claro, dos distúrbios provocados pelos coliformes fecais e outras bactérias presentes nas águas contaminadas por esgoto doméstico.
   No caso específico da gestão dos recursos hídricos, que envolve, dentre outras atribuições, o controle da qualidade da água dos mananciais, não existe ainda implantado, na maioria das cidades brasileiras, um sistema permanente de monitoramento da qualidade de água dos nossos rios e lagoas. Esta é uma necessidade premente se desejamos construir um futuro tranqüilo, no que se refere à garantia de reservas de água potável de boa qualidade, para as próximas gerações.

Retirado do livro "Pedagogia da Água"
Autor: João de Deus Souto Filho