sábado, 25 de agosto de 2012

A mão que esculpe a face do planeta

O mágico cinzel do criador. Assim deveria ser designada a água, que por mais de quatro bilhões de anos esculpe a superfície do nosso planeta. Nos seus diferentes estados (sólido, líquido e gasoso), a água é o agente erosivo mais eficiente que atua sobre as rochas da crosta terrestre. No estado sólido, constituindo as geleiras que se formam nas regiões polares e nas elevadas altitudes (picos nevados), o gelo rasga o substrato rochoso dando origem a vales de dimensões e formas variadas. No estado gasoso, na forma de emanações provenientes do interior da Terra, a água contribui para o chamado intemperismo químico, provocando redução na resistência das rochas, facilitando assim o processo de erosão.


Mas é no estado líquido que a água realiza o seu principal trabalho de agente modelador da superfície da Terra. Seja como gotas de chuva que batem como minúsculos martelos sobre a parte sólida do Planeta, seja como fluido corrente que escoa nos rios, nas corredeiras, nos mares e oceanos, ou mesmo nas quedas d’água e nas cachoeiras, esse líquido de constituição simples, quase sempre incolor, realiza a sua laboriosa tarefa de modificar as paisagens. E como num passe de mágica, a mole água corta a dura rocha, gerando formas caprichosas que vão compor este belo mosaico que denominamos “superfície terrestre”.

Quem tem a oportunidade de visitar uma cachoeira sente de perto a força da água em movimento e pode perceber a sua capacidade de “rasgar” a terra, contribuindo para a modificação da paisagem. Recentemente tive a oportunidade de visitar as Cataratas do Iguaçu, uma das mais espetaculares quedas d’água do planeta. Fiquei maravilhado com a sua magnitude e não cansei de admirar aquele exemplo singular de agente transformador da morfologia da superfície terrestre.

A força das ondas e a ação das marés também são importantes agentes modificadores da paisagem. Elas são responsáveis pelo “desenho” do nosso litoral, pela modelagem das nossas encostas. O vaivém das águas dos oceanos atua como gigantescos formões que, lentamente, desgastam a dura rocha, criando formas caprichosas e desenhando enseadas paradisíacas ao longo das regiões costeiras de continentes e ilhas.

Pouca gente sabe que o gelo também contribui para “modelar” a face do planeta. Mas a mãe natureza nos apresenta inúmeros exemplos de paisagens formadas pela ação do gelo como agente erosivo, que corta as rochas como uma afiadíssima navalha. Na maioria das vezes, essa ação se dá através do lento deslocamento das geleiras que estão apoiadas sob substratos rochosos ou pelo movimento frenético das massas de gelo e neve que descem dos picos gelados na forma de avalanches. Em algumas situações, o gelo funciona como cunhas que partem as rochas, resultantes do congelamento das águas que penetram em fissuras (como a água aumenta de volume, ao passar para o estado sólido, o gelo que preenche micro-fissuras gera esforços capazes de provocar o quebramento das rochas).

Contudo, não é apenas na face externa do planeta que a água altera as paisagens. Infiltrada através de fissuras ou penetrando lentamente no solo, a água também realiza o seu trabalho de escultora, dando origem a túneis e cavernas subterrâneas, especialmente naquelas regiões constituídas por rochas calcárias. E aí somos presenteados com magníficas geometrias que compõem cenários mágicos e encantadores, constituindo as chamas “Paisagens Cársticas”, termo geológico utilizado para descrever terrenos moldados pela água que percola regiões constituídas por rochas calcárias.

Se nos permitimos contemplar as belezas naturais que a mãe Terra nos oferece, somos levados a refletir sobre os agentes que transformam, a cada instante, a face do Planeta. Observando com um pouco de atenção, iremos perceber que a água tem papel fundamental como elemento modelador da superfície planetária. E dessa interação Terra-Água surgem magníficas formas que nos deixam maravilhados.

Retirado do livro "Pedagogia da Água" (Autor: João de Deus Souto Filho)

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Gestão das àguas: A Vez do Cidadão

          A constituição de 1988 criou mecanismos concretos que possibilitam a participação efetiva do cidadão brasileiro na tomada de decisão sobre assuntos que afetam diretamente a sua qualidade de vida. Um exemplo disso é a gestão dos recursos hídricos. A legislação em vigor, que trata do planejamento e gestão das águas no Brasil (Lei Federal nº 9.433), adota como princípios básicos os seguintes elementos: a bacia hidrográfica é tomada como unidade básica de planejamento, permitindo realizar com maior precisão o confronto entre as disponibilidades e as demandas de água no território nacional; considera os múltiplos usos da água como parâmetro de referência, estabelecendo que todos os setores usuários de água têm igual acesso ao uso dos recursos hídricos; reconhece que a água é um bem finito e vulnerável, e que por esse motivo precisa ser preservada; reconhece o valor econômico da água, sendo o mesmo indutor do uso racional desse recurso natural, imprescindível para a vida e fundamental para o desenvolvimento sustentável; e estabelece a filosofia da gestão descentralizada e participativa, o que significa dizer que tanto os usuários de água, quanto a sociedade organizada e as ONGs, juntamente com os órgãos municipais, estaduais e federais, podem influenciar diretamente no processo de tomada de decisão.

          Quanto aos mecanismos criados para a condução da política estadual de recursos hídricos, podemos observar que a lei estadual nº 6908/96 explicita, no seu capítulo 3, artigo 19, a instituição do “Sistema Integrado de Gestão dos Recursos Hídricos – SIGERH”, cuja estrutura organizacional compreende: o Conselho Estadual de Recursos Hídricos, a Secretaria Estadual de Recursos Hídricos e os Comitês de Bacias Hidrográficas. Dessas três entidades, tanto o Conselho Estadual de Recursos Hídricos como os Comitês de Bacias Hidrográficas têm assentos reservados para representantes da sociedade organizada e usuários de água, com direito a voz e voto.

          Para termos uma idéia da força dessas entidades, que podem contar com a participação do cidadão comum, relacionamos abaixo as atribuições dos Comitês de Bacias Hidrográficas no estado do Rio Grande do Norte, conforme descrito no artigo 25 da lei 6908/96: aprovar o Plano Estadual de Recursos Hídricos e suas atualizações, referente à respectiva Bacia Hidrográfica; aprovar o Plano Diretor da Bacia Hidrográfica; aprovar a proposta de programas anuais e plurianuais e aplicação de recursos financeiros em serviços e obras de interesse para a gestão de recursos hídricos da Bacia Hidrográfica; acompanhar a execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos e sugerir as providências necessárias ao cumprimento de suas metas, no âmbito da respectiva Bacia Hidrográfica; aprovar o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso da água, destinados à respectiva Bacia Hidrográfica; promover entendimentos, cooperação e conciliação entre os usuários dos recursos hídricos na bacia hidrográfica; e avaliar e aprovar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos da bacia hidrográfica.

          Como podemos ver, tanto a legislação federal quanto a estadual disponibilizam para nós, cidadãos, oportunidades concretas para participarmos das decisões sobre o gerenciamento e a preservação dos nossos mananciais de águas superficiais e subterrâneas. Cabe a nós a responsabilidade de exercermos esse direito respaldado por lei.

Retirado do livro "Pedagogia da Água". Autor: João de Deus Souto Filho